O Projeto MELHORIA DA ACESSIBILIDADE DA AVIAÇÃO CIVIL, publicamente conhecido como Aviação Acessível, foi desenvolvido pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), com colaboração da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Federal de São Paulo (IFSP). O projeto foi financiado pela Secretaria Nacional de Aviação Civil (SAC/MINFRA), por meio do Termo de Execução Descentralizada nº 03/2018, publicado no D.O.U. nº 242 de 18 de dezembro de 2018. O projeto teve como objetivos:
- Compreender as principais barreiras à participação dos passageiros com deficiência no ciclo de viagem aérea;
- Elaborar um Manual de Acessibilidade para a Aviação Civil Brasileira;
- Desenvolver material de apoio para a capacitação de operadores aéreos e aeroportuários nos processos de atendimento no ciclo de viagem;
- Desenvolver instrumentos de avaliação para identificar a adesão e a efetividade das práticas de acessibilidade no setor;
- Desenvolver uma metodologia para a concessão de um Selo de Acessibilidade, indicando aos operadores aeroportuários e aéreos o seu estágio de desenvolvimento nos processos de atendimento aos PCDs e as rotas para o aperfeiçoamento dos seus serviços;
- Difundir as práticas de acessibilidade e avaliar os impactos do projeto no setor.
Para a consecução de tais objetivos, o projeto foi desenvolvido tendo como referência a metodologia de Pesquisa Ação, desenvolvida em cinco fases: Exploratória; Diagnóstico; Prognóstico; Difusão; e Avaliação.
Fase Exploratória: A fase exploratória teve como objetivo revisar estudos e experiências anteriores, identificar práticas de acessibilidade em aeroportos nacionais e internacionais e formular metodologias adequadas para a condução do projeto. O principal resultado dessa fase foi consolidado no Modelo de Acessibilidade Integral.
Fase Diagnóstico: A fase de diagnóstico aprofundou os resultados obtidos na fase anterior, avaliando a viabilidade de adoção das práticas identificadas, levando em consideração a realidade da aviação civil brasileira e a perspectiva dos usuários. Os resultados desta fase foram consolidados no Manual de Acessibilidade na Aviação Civil.
Fase Prognóstico: A fase de prognóstico articulou o estágio atual de acessibilidade na aviação civil brasileira com o estado futuro desejável no setor. Nessa fase foram estabelecidas diretrizes, critérios e indicadores que orientam as ações de operadores aéreos e aeroportuários. Os resultados dessa fase foram consolidados na Metodologia para a concessão do Selo de Acessibilidade.
Fase Difusão: A fase de difusão objetivou difundir no setor de aviação civil os resultados do projeto e a aplicação das metodologias desenvolvidas. O processo de difusão foi sustentado pela Plataforma Aviação Acessível, voltada para operadores aéreos, aeroportuários e usuários. Fase de Avaliação: A fase de avaliação teve como objetivo avaliar o nível de aderência das companhias aéreas e operadores aeroportuários às práticas de acessibilidade na aviação civil, por meio da aplicação dos instrumentos desenvolvidos no projeto e da concessão do Selo de Acessibilidade para unidades aeroportuárias em todo o país.
0.1. PESSOAS COM DEFICIÊNCIA E ACESSIBILIDADE
As discussões em relação ao conceito de deficiência demonstram que ele é complexo, dinâmico, multidimensional e, sobretudo, que a presença de algum impedimento corporal não determina, isoladamente, a participação ou restrição da pessoa com deficiência em qualquer atividade. A realização de atividades e a participação, definida como o envolvimento em uma situação de vida, são determinadas na interação entre fatores individuais com os fatores ambientais e sociais. Esse paradigma da deficiência está presente na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência das Nações Unidas, a qual foi construída com a participação ativa dessa população.
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas (Brasil, 2014, artigo 1º).
Apesar dos avanços e do entendimento da deficiência sob a perspectiva dos direitos humanos, pessoas com deficiência ainda enfrentam diversas barreiras para a inclusão e participação social. Dentre estas se destacam a discriminação e estigmas associados à deficiência e à falta de acessibilidade aos ambientes físicos, incluindo os transportes, e aos ambientes virtuais.
A acessibilidade é um direito que possibilita às pessoas com deficiência viverem de forma independente, exercerem sua cidadania e participarem da vida social. A acessibilidade se relaciona ao meio físico, aos transportes, à informação e à comunicação, incluindo sistemas e tecnologias, serviços e instalações abertas ao público ou de uso público e é fundamental o pleno gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais.
Na aviação civil, diferentes normas e resoluções abordam condições e procedimentos para grupos específicos de passageiros, entre os quais são incluídas pessoas com deficiência e pessoas com mobilidade reduzida. Na aviação civil brasileira, as questões de acessibilidade e atendimento às pessoas com deficiência são garantidas pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Em sua normativa são apresentados os procedimentos relativos à acessibilidade, aplicando-se aos passageiros, operadores aéreos, operadores aeroportuários e prestadores de serviço. As questões normativas e regulatórias são relevantes ao garantirem as condições básicas e definirem os papéis dos diferentes agentes na prestação dos serviços e atendimento aos passageiros na aviação civil. Porém, as relações entre deficiência e acessibilidade são construídas em um ambiente social com múltiplas interações. Nesse sentido, uma perspectiva mais ampla faz-se necessária.
0.2. O MODELO DE ACESSIBILIDADE INTEGRAL
O Modelo de Acessibilidade Integral é fundamentado na teoria da atividade. Essa teoria considera que toda ação humana é orientada a um objetivo e mediada por dispositivos técnicos e sociais. O poder agir de um sujeito dotado de competências singulares, em relação direta ou indireta com o agir de outros sujeitos, decorre de características socioambientais presentes no contexto no qual estão inseridos. Em termos de acessibilidade, a ação remete para quatro dimensões fundamentais: Gestão, Comunicação, Deslocamento e Uso.
Gestão: Características socioambientais que possibilitem o exercício das competências pelos agentes que realizam atividades de atendimento e pelos passageiros, bem como, o desenvolvimento e o aperfeiçoamento das mesmas. No ciclo de viagem, a dimensão Gestão engloba: as atividades de coordenação, as parcerias e o desenvolvimento de competências nos processos de atendimento; a gestão da demanda de passageiros, acompanhantes e dos equipamentos disponíveis; os serviços de assistência durante todas as fases da viagem; e a gestão de infraestrutura e das informações relativas aos atendimentos.
Comunicação: Poder comunicar-se é uma condição básica para toda ação humana. Ela se dá de forma direta entre indivíduos, mediada ou não por artefatos; ou indireta, por meio de símbolos e sinais presentes no ambiente. No ciclo de viagem aérea, a dimensão de Comunicação engloba: os recursos informacionais úteis ao planejamento antes e após a viagem; as informações, sinalizações, orientações de percursos, orientações de segurança e de direcionamento no interior das unidades aeroportuárias; recursos comunicacionais para interação com atendentes do aeroporto e/ou companhia aérea; e recursos e procedimentos para compreensão das informações no ciclo de viagem e no uso dos equipamentos e instalações.
Deslocamento: Poder deslocar-se com autonomia e independência, mediado por auxílios técnicos e humanos, constitui uma outra dimensão básica para a efetividade da ação. No ciclo de viagem aérea, a dimensão Deslocamento engloba: recursos e equipamentos para deslocamento até à unidade aeroportuária e, no aeroporto, em suas áreas internas e externas; recursos para deslocamento e acesso nas operações de embarque e desembarque; e recursos para deslocamento do interior da aeronave.
Uso: Poder usar e realizar atividades comuns e corriqueiras possibilita a efetiva participação dos passageiros em um determinado ambiente. No ciclo de viagem aérea, a dimensão Uso engloba: as características dos mobiliários e equipamentos que possibilitem o atendimento/autoatendimento; recursos adequados para uso de banheiros, vestiários e espaços de higiene e cuidados pessoais; e os espaços preferenciais e ambientes dedicados ao atendimento e espera de passageiros, acompanhantes e animais de serviço.
Quando considerados de forma conjunta, as quatro dimensões da acessibilidade integral produzem como efeito sobre o ambiente, qualidades que possibilitam a ação dos sujeitos para o exercício e o desenvolvimento das suas competências. Em termos ideais, o ambiente deve permitir que o sujeito possa se orientar, sabendo onde está e para onde deve ir, e se comunicar com os demais agentes presentes na situação; deve possibilitar que o sujeito se movimente de um ponto ao outro de forma livre e desimpedida; deve possibilitar o uso efetivo e a realização das atividades comuns a todos aqueles presentes na situação; e, por fim, deve possibilitar a ação dos sujeitos respeitando as suas competências e favorecendo o seu desenvolvimento. Tais características socioambientais devem favorecer a ação dos agentes, sejam passageiros ou atendentes. Dessas qualidades idealizadas resulta um mantra: orientar, comunicar, deslocar, usar e desenvolver.
0.3. PARTICIPANTES DO PROJETO
O Projeto contou com uma equipe composta por docentes, pesquisadores, pós-graduandos, graduandos e profissionais para apoio administrativo e técnico conforme apresentado a seguir:
Coordenadores
Carlos Eduardo Gomes Souza (Coordenador)/MPA/SNAC
Nilton Luiz Menegon (Coordenador)/UFSCar/DEP/Doutor
Talita Naiara Rossi Silva (Coordenadora)/FMUSP/FOFITO/Doutora
Luiz Antonio Tonin (Coordenador)/UFSCar/DEP/Doutor
Nilva Lopes (Coordenadora)/UFSCar/FAI/Pós Graduada
Pesquisadores
Andre Ditomaso/IFSP/DC/Doutor
Heloisa Giangrossi Machado Vidotti/UFSCar/DEP/Doutora
João Alberto Camarotto/UFSCar/DEP/Doutor
Luis Ernesto Bueno Salazar /UFSCar/DES/Doutor
Marina Greghi Sticca/FFCLRP/DPSI/Doutora
Miguel Antonio Bueno da Costa/UFSCar/DEP/Doutor
Rochele Amorin Ribeiro /UFSCar/DECIV/Doutora
Pós Graduandos
Danilo Barbosa dos Santos/FFCLRP/DPSI/Mestrando
Flávia Helen Moreira da Silva/FFCLRP/DPSI/Doutoranda
Igor Santos/UFSCar/DEP/Doutorando
Larissa Peres Vitti de Carvalho/UFSCar/DL/Mestranda
Lucas Corrêa Toniolo/DEP/Mestrado/UFSCar/UFSCar/DEP/Mestrando
Luiz Ricardo Gonzaga Ribeiro/UFSCar/DAC/Mestrando
Raphael Rezende de Oliveira/UFSCar/DEP/Mestrando
Graduandos
Ana Carolina Mossini/FFCLRP/DPSI/Graduanda
Ana Eliza Rizzioli Martins/UFSCar/DEBE/Graduanda
Ana Laura Xavier da Silva/UFSCar/DEP/Graduanda
Bárbara Stefany Bispo Arruda/UFSCar/DCI/Graduanda
Beatriz Ferreira Cordeiro/UFSCar/DEP/Graduanda
Camila da Silva Santos/UFSCar/DTO/Graduanda
Caroline da Costa Dias/UFSCar/DTO/Graduanda
Caue Adabo Gastaldi/IFSP/DC/Graduando
Desirreê Sayuri Toma Cezário da Silva/UFSCar/DECIV/Graduanda
Dhara Winther de Castro Moreira/UFSCar/DEP/Graduanda
Elisandra Cristina Barbosa de Oliveira/UFSCar/DEP/Graduanda
Everton de Oliveira Rocha/UFSCar/DEP/Graduando
Felipe da Silva Lopes/UFSCar/DEP/Graduando
Fernanda Cristina Nunes da Silva/FMUSP/FOFITO/Graduanda
Gabriel Dalla Déa Machi Postal/UFSCar/DEP/Graduando
Gabriel de Souza Santos /UFSCar/DEP/Graduando
Gabriel Fernando Kotesky/UFSCar/DEP/Graduando
Gabriela Boniholi/UFSCar/DPSI/Graduanda
Giovanna Vitória Macedo Lopes/UFSCar/DeCiv/Graduanda
Graziele Deliane Santos de Moura/UFSCar/DL/Graduanda
Guilherme Barros Maciel/UFSCar/DEP/Graduando
Guilherme Fernandes Felix de Almeida/UFSCar/DECIV/Graduando
Gustavo Borges de Mendonça/UFSCar/DeCiv/Graduando
Heitor Gonçales Sazaki/UFSCar/DEP/Graduando
Jean Carlos Cremonezzi/IFSP/DC/Graduando
Jéssica Natália Kado/UFSCar/DEP/Graduanda
João Antônio Araujo e Souza/IFSP/DC/Graduando
João Vitor Ivo dos Reis/FMUSP/FOFITO/Graduando
Kelly Gomes Moreira Almeida/FMUSP/FOFITO/Graduanda
Kelly Gonçalves/UFSCar/DEP/Graduanda
Larissa Garcia Leal de Aquino Gonçalves/UFSCar/DEP/Graduanda
Laura Brandão Naranjo/UFSCar/DL/Graduanda
Letícia Gomes Stancov Fonseca/UFSCar/DEP/Graduanda
Leticia Rodrigues Pinaffi/UFSCar/DEP/Graduanda
Loueny Larissa Guerra Ferreira/UFSCar/DCSo/Graduanda
Lucas Anielo Ceoni/IFSP/DC/Graduando
Luca Battistini/UFSCar/DEP/Graduando
Marielle Cristina Luciano/UFSCar/DFISIO/Graduanda
Marina Balieiro Rodrigues/UFSCar/DEP/Graduanda
Mateus Vinicius Carneiro de Campos/UFSCar/DEMEC/Graduando
Melissa Limonta/UFSCar/DEP/Graduanda
Paula Vitória Martins Larocca/UFSCar/DC/Graduanda
Pedro Evêncio Oliveira Teixeira/UFSCar/DEMEC/Graduando
Pedro Morini da Mota/UFScar/DC/Graduando
Rebeca Baracho Moreira Sirio/UFSCar/DFisio/Graduanda
Renan Alves de Oliveira/IFSP/DC/Graduando
Richard Junior Maraschalchi da Cruz/UFSCar/DEP/Graduando
Sharon Bae/UFSCar/DEP/Graduanda
Thiago Costa Oliveira/UFSCar/DEP/Graduando
Vinicius Delgado Marcelino/UFSCar/DEP/Graduando
Vitor Corradini/UFSCar/DEMEC/Graduando
Vitor de Lima Pastore/IFSP/DC/Graduando
Yasmim Kina Augusto Lima Motta/FMUSP/FOFITO/Graduanda
Yuri Soares/UFSCar/DEMEC/Graduando
Apoio Técnico
Alexandre Carneiro/ANAC
Anaildes Sena/MDHC/SNDPD
Christian Andre Haddad Govastki/ANAC
Erica Ramalho de Oliveira/ANAC
Fabiola Calixto/MDHC/SNDPD
Fabrício Francisco do Nascimento/UFSCar/DEP
Hisaac Alves de Oliveira/MDHC/SNDPD
Isabela Cristina Diniz Baruffi/ANAC
Jefferson Paulo Pereira/ANAC
Rodrigo Abreu de Freitas Machado/MDHC/SNDPD
Yuri César Cherman/ANAC
Apoio Administrativo
Luan Ariel de Oliveira/UFSCar/FAI/Graduado
Sandra Marcia Gonçalves Pereira/UFSCar/FAI/Graduada
0.4. MANUAL DE ACESSIBILIDADE PARA A AVIAÇÃO CIVIL BRASILEIRA
O Manual de Acessibilidade para a Aviação Civil Brasileira tem como objetivo apresentar diretrizes e práticas de acessibilidade, assim como, um programa de treinamento para apoiar aeroportos e companhias aéreas na melhoria das experiências de viagem, principalmente, dos passageiros com deficiência, incluindo pessoas com transtorno do espectro do autismo (considerado deficiência para efeitos legais – Lei 12.764/2012).
O Capítulo 1, Fundamentos do Projeto “Aviação Acessível”, apresenta os conceitos sobre Deficiência, Acessibilidade e Acessibilidade Integral e o referencial da Teoria da Atividade, que nortearam o seu desenvolvimento.
O Capítulo 2, Identidade Visual, apresenta o desenvolvimento de uma estratégia de comunicação para mapear as práticas de acessibilidade no aeroporto, orientar passageiros em pontos-chaves do aeroporto, intermediar a comunicação interpessoal entre passageiros e atendentes, antecipar informações aos passageiros no planejamento da viagem e para definir uma comunicação visual, visando facilitar a compreensão dos conceitos, da estrutura e da aplicabilidade dos produtos desse projeto.
No Capítulo 3, Práticas de Acessibilidade, são apresentadas práticas relacionadas às dimensões fundamentais da Acessibilidade Integral, a saber: gestão, comunicação, deslocamento e uso. As práticas de acessibilidade foram identificadas em aeroportos nacionais e internacionais. Para cada prática, foi elaborada uma Ficha de Caracterização da Prática (FCP), que está disponível no Apêndice 1 deste manual.
O Capítulo 4, Treinamentos, traz orientações para o desenvolvimento de processos de qualificação e de educação, respaldando ações educacionais no aprimoramento do serviço proporcionado para aqueles com deficiência ou mobilidade reduzida. No contexto do transporte aéreo, os investimentos na qualificação do pessoal de apoio presente nas diversas etapas da viagem são necessários a fim de garantir a qualidade do atendimento. Por fim, o Capítulo 5 apresenta o Selo de Acessibilidade que constitui um instrumento de valorização e de reconhecimento dos esforços voltados para a melhoria da acessibilidade na aviação civil brasileira. O Selo visa retroalimentar o sistema, indicando aos operadores aeroportuários e aéreos o estágio atual em que se encontram em relação à acessibilidade integral e oferece direcionamentos para o desenvolvimento da infraestrutura, dos processos de atendimento e de gestão. O selo considera a perspectiva dos passageiros e usuários, possibilitando incorporar as contribuições destes para a evolução do sistema. A periodicidade do processo de concessão do Selo de Acessibilidade possibilitará a avaliação dos impactos das políticas públicas voltadas para a acessibilidade na aviação civil.